Em que pese o fato do presidente Jair Bolsonaro (PL) ter solicitado, na terça-feira à tarde, que os caminhoneiros liberassem as rodovias que vêm ocupando em todo Brasil desde a noite do último domingo, somente parte deles atendeu a solicitação. Na mesma toada, Bolsonaro também repassou ao Ministro Chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, a incumbência de dar início ao processo de transição de sua gestão para o futuro governo, a ser comandado pelo ex-presidente Lula da Silva (PT). Ainda que de forma sutil, o presidente deu seu recado: Voltem para casa e deixem Lula assumir.
De todo modo, os simpatizantes de Bolsonaro parecem ter entendido o contrário. Os bloqueios continuaram em grande parte do país, e ontem milhares de pessoas tomaram as ruas de grandes cidades do Brasil para protestar contra o resultado da eleição presidencial. Isto está acontecendo por um simples motivo: o movimento bolsonarista é maior do que o presidente Jair Bolsonaro.
Trata-se de um movimento que surgiu por volta de 2005, na Era do mensalão, mais de dez anos antes de Bolsonaro passar a ser conhecido em todo o país. Antes ele era apenas um deputado federal representando o Rio de Janeiro. Já na eleição presidencial de 2006, o então presidente Lula viu sua famosa onda de 2002 se transformar em marola, com dez Unidades da Federação lhe impondo derrotas no segundo turno, dentre elas São Paulo e os três Estados do Sul, responsáveis por metade da economia nacional. O pleito de 2010, que elegeu Dilma Rousseff (PT), assim como o de 2014, que a reelegeu, fizeram o PT definhar, com a presidente quase perdendo a eleição para Aécio Neves (PSDB) em sua busca de um segundo mandato. Já naquele momento, Dilma fez 51,64% dos votos, contra 48,36% de Aécio. Observe que o anti-petismo já estava em alta, mesmo antes de Bolsonaro surgiu no cenário nacional, o que somente acontece efetivamente dois anos depois.
Notadamente, o presidente Jair Bolsonaro é meramente um ponto gravitacional do descontentamento nacional, oriundo, supostamente, de desmandos da gestão nacional do PT junto ao Governo Federal. Não fosse Bolsonaro, seria outro, e não fosse outro, seria outro ainda. Lula não salvará seu governo desta pressão, em que pese todos os esforços do sistema para que isto aconteça. A história do mundo é uma só, e em cenários como este a história sempre mostrou que os movimentos sociais são muito maiores do que os governos.
O que o PT precisa fazer neste momento é não provocar. Quanto mais provocar, maior será a pressão. Também precisa não mexer no que está posto. Quanto mais mexer, maior será a pressão. Por fim, precisará atender demandas da direita. Quanto mais atender estas demandas, menor será a pressão. Esta é a única maneira de Lula conseguir governar, mesmo que Bolsonaro decida ir morar amanhã na Cochinchina. O fato é que não se trata, como nunca se tratou, do desejo de Bolsonaro. Se trata do descontentamento da classe média frente ao que ela considera ser econômica e moralmente errado.
Jorginho diz que “desejo do eleitor precisa ser respeitado”
Governador eleito de Santa Catarina, senador Jorginho Mello (PL) passou a integrar a turma do “deixa disso”. Já na segunda-feira ele pediu que os caminhoneiros suspendessem os bloqueios nas rodovias federais e estaduais para que a vida voltasse a normalidade. Na terça, depois que o presidente Jair Bolsonaro (PL) se pronunciou no mesmo sentido, e autorizou o início da transição governamental, Jorginho declarou que “o povo é soberano, e o desejo de eleitor precisa ser respeitado”. Vale ressaltar que o senador sempre foi um político moderado, e cumpre, neste momento, com a obrigação de não inflamar os ânimos da população descontente com o resultado da eleição nacional.
Bolsonaro pede que rodovias sejam desobstruídas
Presidente Jair Bolsonaro (PL) divulgou vídeo via redes sociais, ontem à noite, solicitando, mais uma vez, que as rodovias que estão interditadas por manifestantes sejam desobstruídas. Ele ressaltou que reconhece “as manifestações democráticas”, não se interpôs a elas, mas solicitou pontualmente a desobstrução rodoviária, dentro da lógica da preservação constitucional do direito de ir e vir. Visivelmente abatido, Bolsonaro disse que também estava bastante “chateado e triste” com o resultado do segundo turno da eleição presidencial, mas ressaltou que é necessário “ter a cabeça no lugar”. Em vários momento, enfatizou reconhecer a legitimidade dos protestos, mas solicitou que os mesmos não interfiram no cotidiano econômico e social do país.